segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Indio, vice de Serra, acertou o alvo


Revista Veja - 26/07/2010

Duda Teixeira

O episódio foi uma afobação de iniciante, mas o vice de José Serra está correto em se espantar com a ligação de membros do PT com as Farc e seus narcoterroristas Em um depoimento gravado em vídeo e divulgado no site do PSDB, Índio da Costa, candidato a vice-presidente na chapa de José Serra, abriu fogo: "Todo mundo sabe que o PT é ligado às Farc, ligado ao narcotráfico, ligado ao que há de pior". A declaração de Índio foi considerada um insulto ao partido e a seus milhões de eleitores. Ela produziu uma reação justificadamente forte por parte de José Eduardo Dutra, presidente do PT, que chamou Índio de "desqualificado" e medíocre". O partido do governo entrou com ação por crime contra a honra, danos morais e ganhou direito de resposta na Justiça Eleitoral. Despida de seu núcleo explosivo, a acusação de Índio da Costa encontra amparo na realidade. O PT tem vínculos históricos, públicos e inegáveis com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).
Algum petista, inclusive a Dilma, explicou por que o PT é ligado às Farc, ou negou isso?, perguntou o candidato tucano José Serra, dando contornos mais reais à acusação de seu vice. Serra lembrou que as Farc são o narcotráfico, mas ressalvou que isso não quer dizer que os petistas são traficantes. Há duas décadas o PT mantém vínculos ora escancarados, ora dissimulados com as Farc. Quando foram fundadas, em 1964, as Farc eram um grupo guerrilheiro de inspiração guevarista cujo objetivo era derrubar o governo colombiano e instalar uma ditadura comunista. Desde os anos 80, as pretensões políticas deram lugar ao banditismo puro e simples. Os membros das Farc entraram no negócio da cocaína, da extorsão mediante sequestro e da venda de armas a criminosos brasileiros. Muitos petistas condenam o que chamam de "opção armada das Farc", mas, quando se veem diante de um guerrilheiro fardado, sentem um chamado vindo do fundo do coração. "As Farc, em síntese, propõem uma sociedade mais igualitária", diz o senador petista Eduardo Suplicy. Essa ideia. há muito sem vínculo com a realidade, de que as Farc têm um projeto político leva muitos petistas a organizar palestras de terroristas no Brasil, a protegê-los de pedidos de extradição e até a arrumar emprego para seus parentes (veja o quadro nas págs. 74 e 75). Na área diplomática. esse comportamento se traduz na relutância da política externa do governo Lula em qualificar as Farc como um grupo terrorista, dando a ele o status de força beligerante. A afinidade entre PT e Farc foi oficializada em 1990, quando Lula fundou o Foro de São Paulo e convidou diversos movimentos de esquerda da América Latina, incluindo as Farc, para debater o futuro do socialismo, que naquele momento sucumbia na Europa. Os encontros do Foro de São Paulo ocorrem a cada um ou dois anos. Oficialmente, a última vez em que as Farc participaram foi em 2001, em Cuba. Representantes informais dos interesses do grupo, no entanto, estavam presentes na edição uruguaia, em 2008. Nos últimos dez anos, integrantes do bando tornaram-se atrações em diversos encontros no Brasil, como o Fórum Social Mundial em Porto Alegre, e foram recebidos por políticos petistas em seus gabinetes. "Isso faz pane de uma estratégia de internacionalização. iniciada pelas Farc nos anos 90, para tentar vender uma imagem política, obter recursos e, claro, deslegitimar a democracia colombiana", diz o cientista político Gerson Arias, coordenador da Fundação Ideias para a Paz, de Bogotá. Quando Lula entrou na campanha presidencial de 2002, as alas mais pragmáticas do PT passaram a evitar publicamente as Farc. Já os laços velados com os guerrilheiros foram mantidos. principalmente com o ex-padre colombiano Olivério Medina, que hoje vive em Brasília. Documentos da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) revelados por reportagem de VEJA de 2005 mostraram que, em 2002, Medina participou de um churrasco com petistas em Brasília e prometeu 5 milhões de dólares para ajudar na campanha. Com o PT no poder, o episódio foi varrido para debaixo do tapete e a investigação suspensa antes que indícios da doação dos terroristas pudessem ter sido recolhidos. Medina, reconhecido pelo PT como embaixador das Farc no Brasil, é acusado de ter comandado quatro ações do grupo na Colômbia, as quais resultaram na morte de 95 militares e no sequestro de mais de 100 pessoas. Preso pela Polícia Federal em 2005, ganhou o status de refugiado no Brasil e contou com a ajuda petista para não ser extraditado e julgado por seus crimes na Colômbia. Em documentos descobertos no computador do comandante das Farc Raúl Reyes, morto pelo Exército colombiano no Equador, em 2008, é possível encontrar várias mensagens trocadas entre Medina e outros narcoterroristas, com referências a petistas e ex-petistas. Em uma delas, Medina escreve a Reyes: "Estive falando com a deputada federal Maria José Maninha [ex - PT, hoje PSOL]. Combinamos que ela vai me abrir caminho rumo ao presidente via Marco Aurélio Garcia". Garcia, vale lembrar, é o assessor especial da Presidência da República. Em outra mensagem, de fevereiro de 2004, o terrorista José Luis escreve ao mesmo Reyes: "Por intermédio do legendário líder do PT Plínio Arruda Sampaio [atualmente candidato à Presidência pelo PSOL], chegamos a Celso Amorim, atual ministro das Relações Exteriores. Plínio nos mandou falar com Albertão [Edson Antônio Albertão, ex-vereador do PT em Guarulhos], porque o ministro está disposto a nos receber. Tão logo tenha espaço na sua agenda, ele nos recebe em Brasília". Medina também agradece em 2007 a atenção dada a sua mulher, Angela Slongo: "A Mona começou no seu emprego novo. Para protegê-la ou impedir que a direita em algum momento a incomodasse, a deixaram na Secretaria da Pesca desempenhando o que aqui chamam de cargo de confiança ligado à Presidência da República". Angela, uma professora paranaense, ganhou o cargo a pedido de Dilma Rousseff, então chefe da Casa Civil, como comprovou documento assinado pela ex-ministra e publicado pela Gazeta do Povo, de Curitiba, em junho de 2008. Índio generalizou, mas acertou no alvo. O PT e as FARC Os vínculos entre o Partido dos Trabalhadores e os narcoterroristas das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia iniciaram-se há duas décadas e nunca foram oficialmente rompidos. Encontro de camaradas O PT fundou, com as Farc e o Partido Comunista de Cuba, o Foro de São Paulo, em 1990, com o objetivo de debater os rumos da esquerda após a queda do Muro de Berlim Cerimônia de boas-vindas Em 1999, o então governador do Rio Grande do Sul, o petista Olívio Dutra, recebeu no Palácio Piratini um membro das Farc, Hernán Ramírez Fórum Social Mundial Em 2001, o colombiano Javier Cifuentes, das Farc, participou do encontro de esquerda em Porto Alegre a convite do então deputado Renato Simões, do PT Promessa de doação Em 2005, VEJA revelou que o ex-padre Olivério Medina, das Farc, se encontrou com petistas e prometeu 5 milhões de dólares para a campanha de 2002 Fica, Medina Petistas e políticos de outros partidos de esquerda fizeram um abaixo-assinado para impedir a extradição de Medina para a Colômbia após sua prisão pela Polícia Federal, em 2005. Emprego para a esposa A mulher de Olivério Medina, a paranaense Angela Slongo, foi contratada pelo Ministério da Pesca em 2006. O pedido de contratação foi assinado por Dilma Rousseff, então chefe da Casa Civil. Pistas no computador A revista colombiana Cambio publicou em 2008 e-mails trocados entre Raúl Reyes, comandante das Farc morto no mesmo ano, Olivério Medina e outros terroristas. Nas mensagens, eles dizem ter relações com o chanceler Celso Amorim, Marco Aurélio Garcia, assessor de Lula, e outros sete petistas A outra conexão Farc Corno sempre, o presidente Hugo Chávez esperneou, xingou e ameaçou ir à guerra. Tudo para não ter de explicar as inúmeras evidências, apresentadas na semana passada em reunião da Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington, de que teria transformado a Venezuela em centro de treinamento e refúgio de terroristas colombianos. No encontro, o embaixador da Colômbia Luis Alfonso Hoyos mostrou vídeos, fotografias e mapas que revelavam a presença de 1500 membros das Farc e do Exército de Libertação Nacional (ELN) espalhados por 39 acampamentos no país vizinho. Em algumas fotografias, Carlos Marín Guarín, o Pablito, o principal chefe militar do ELN, aparece de bermuda, cerveja Polar nas mãos e óculos escuros na praia venezuelana de Chichiriviche. Os acampamentos mostrados por Hoyos pouco têm em comum com os que ficam na Colômbia, escondidos na selva e sempre de curta duração. As instalações usadas pelos criminosos colombianos na Venezuela são espaçosas, com pinturas de heróis enaltecidos pelos chavistas nas paredes e lugar para fazer churrasco. Ali os narcoterroristas têm cursos de explosivos e de sequestro e depois, descansados e de barriga cheia, são enviados de volta à Colômbia para lutar contra a democracia e supervisionar a produção de cocaína. Para levantar fundos, vez por outra sequestram cidadãos venezuelanos. Hoyos disse que Chávez ignora os apelos de seu governo para parar de dar guarida a terroristas e sugeriu que a OEA organize uma visita de diplomatas à Venezuela para confirmar a veracidade das acusações. A resposta de Chávez foi quase uma confissão de culpa: ele chamou o presidente colombiano Álvaro Uribe de "mafioso", rompeu as relações diplomáticas e comerciais com o país vizinho e avisou que suas tropas na fronteira estão "em alerta". Na última vez em que adotou um discurso bélico contra a Colômbia, em 2008, Chávez não passou das bravatas à ação. Não deve ser diferente agora. Uribe entrega o cargo no mês que vem a seu ex-ministro da Defesa Juan Manuel Santos. O momento escolhido para a apresentação feita por Hoyos é estratégico: cinco semanas depois da eleição de Santos e dezoito dias antes de sua posse. Dessa forma, Uribe usa o que lhe resta de mandato para comover a opinião internacional e enfraquecer Chávez às vésperas das eleições legislativas de setembro, na Venezuela, deixando para Santos, mais adiante, a tarefa de colocar panos quentes nas relações bilaterais. (Julia Carvalho)

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