Do Blog A Perereca da Vizinha, através da Rede Propará
A ex-auditora geral do Estado, Tereza Cordovil, está farta de política. Ou melhor, da maneira como se faz política no Pará e no Brasil.
Teria sido esse, aliás, o principal fator a motivar o seu pedido de exoneração do cargo, na semana passada.
“Não briguei com ninguém.
Tenho o maior respeito e admiração pela governadora: ela é uma guerreira, que chegou ao governo cheia de boas intenções. Não estou saindo chateada com ela. Estou saindo porque não gosto da maneira como o sistema político funciona no Brasil”, justifica.
É provável que a explicação não convença nem gregos, nem troianos.
Mas, apesar da tranqüilidade que parece imune à ameaça de mil vendavais, Tereza não consegue esconder o incômodo diante do tratamento dado às auditorias que realizou no governo, num desgastante e imprescindível trabalho de controle interno.
Na tarde de ontem, conversei, por telefone, com Tereza Cordovil.
Por questões éticas, ela não fala abertamente das pressões, internas e externas, destes três anos em que esteve à frente da Auditoria Geral do Estado (AGE).
Mas, aqui e ali, deixa entrever o tremendo abacaxi que, estoicamente, teve de descascar.
“Fui testemunha da luta dessa mulher (a governadora Ana Júlia Carepa) para fazer valer o controle interno no governo. E hoje me dói vê-la pagar o preço de ter me mantido no governo”, observa.
E completa, acerca das auditorias que realizou, cujas cópias foram encaminhadas, na última quinta-feira, à Assembléia Legislativa: “O que era para ser uma coisa normal, se transformou numa coisa do outro mundo. Os controles são mal vistos. É uma questão de contaminação do sistema”.
O incômodo de Tereza vem do anúncio, por setores da imprensa, acerca do “conteúdo bombástico” dessas auditorias – ferramentas, aliás, normalíssimas do controle interno, que serve justamente para evitar ou frear a ocorrência de erros formais, ou até de fraudes, dentro da máquina pública.
E aqui cabe um parêntese, para uma explicação desta repórter que vos escreve.
Tereza não diz, mas pessoas próximas a ela admitem que todo esse imbróglio foi causado por um erro do próprio governo petista, que teria sido o primeiro a “partidarizar” esse ganho tão importante da administração pública, que é o controle interno.
Tudo teria começado quando o governo vazou para a imprensa o resultado de uma auditoria no hospital Ofir Loyola, para justificar o troca-troca na instituição, então sob o comando do PMDB.
Furioso com o vazamento da papelada e com a “intervenção branca” em seu quintal, o PMDB partiu para o contra-ataque: através da deputada Simone Morgado, requisitou os relatórios de todas as auditorias realizadas pela AGE.
E como a AGE titubeasse em atender à requisição, Tereza viu-se até ameaçada de um processo.
De sorte que a guerra interna governista virou uma bola de neve, em pleno ano eleitoral.
Ou, melhor: uma fogueira em que poderão arder, indistintamente, todos os partidos.
“A governadora me colocou na AGE e me manteve lá. E eu vejo o nosso trabalho usado para fins políticos”, queixa-se a ex-auditora.
Pior: Tereza acredita que acabou sendo deixada sozinha nessa queda de braço, que ameaçava até manchar-lhe a ficha funcional.
“Se fosse na CGU (Controladoria Geral da União) a AGU (Advocacia Geral da União) teria entrado com uma medida judicial impedindo isso”, diz Tereza, acerca da entrega da documentação à Assembléia Legislativa.
Segundo ela, há uma tese constitucional de que o controle interno só deveria entregar os documentos em seu poder “com motivação”.
“Foi isso que sugeri (ao governo). Mas fiquei sozinha nessa luta. Era para a PGE (Procuradoria Geral do Estado) ter entrado com um pedido de liminar, dizendo que o controle interno é um órgão independente”, relata.
Agora, observa, “O governo está em polvorosa, porque essa coisa toda está com o PMDB, e eu fico me sentindo mal, como se fosse uma arma nas mãos desses partidos. E tenho medo que isso tome uma grandeza que fuja da nossa governabilidade”.
Mesmo assim, ela jura que nos relatórios entregues à Assembléia Legislativa não há irregularidades graves “à exceção de um ou outro órgão”.
Garante que, na maioria, se resumem a problemas de gestão: “É o cara que não fez um inventário ou que tá cedido (para outro órgão) e sumido”.
E resume: “No Detran é que tem coisas graves. No Detran, Sespa, Seduc e Asipag são os mais graves. O resto são casos de gestão. Na minha opinião, não tem ‘bomba’. Mas, não sei o que os outros vão achar”.
Diz, também, que nos relatórios das auditorias o que se vê “é um órgão de governo lutando pela melhoria de gestão”.
Conta que levou os problemas detectados nesses órgãos ao conhecimento da governadora Ana Júlia Carepa “e ela me dizia para resolver, sempre me deu poderes para isso”.
E que muitas vezes foram os secretários e diretores de órgãos a solicitar o pente-fino da AGE: “Eu conversava com os gestores, a Sandra Leite (Iasep), Regina Lima (Funtelpa), Suely Oliveira (ex-Sedurb). Eles me ligavam preocupados e eu ia lá. Os cartéis estão aí, doidos para entrar no governo. E eles (os secretários) ligavam pra gente. E quantas vezes a gente impediu que os problemas acontecessem”.
E arremata: “O Governo não é uma podridão”.
Tereza admite que há, no entanto, “secretários complicados”, mas assinala que vários foram trocados durante o governo.
Reticente, salienta que não cabe ao controle interno o julgamento dos problemas detectados: “O controle interno não está lá para buscar bandidos, para ver se tem ou não bandido, mas, para ver se os projetos estão sendo bem feitos. Valorar não cabe ao controle interno, mas, ao TCE (tribunal de contas), Ministério Público e à própria governadora.”
Lembra que, há três anos, só fez a entrega pública de auditorias realizadas pela AGE nos governos tucanos porque “quando cheguei os gestores já não estavam lá e a gente tinha de se resguardar”.
Insiste que vários dos problemas detectados na atual administração foram, sim, levados ao conhecimento da governadora “e em vários casos ela tomou a decisão de demitir”.
Mas, admite, “existia uma banda do governo que era contra a gente.”
Uma “banda” que, afinal, teria ganhado mais espaço, o que também teria contribuído para o seu pedido de exoneração.
Tereza garante, no entanto, que o chamado “núcleo duro” só teve participação “em termos” na sua saída do governo.
Até porque um dos supostos integrantes desse núcleo, o secretário de Ciência e Tecnologia, Maurílio Monteiro, sempre defendeu o trabalho da AGE: “O Maurílio nunca foi contra mim. Ele me apoiou muito. É uma pessoa muito boa, um intelectual”.
No lado oposto estariam, porém, o consultor geral do Estado, Carlos Botelho, “que sempre deu péssimos conselhos à Ana”, e o ex-chefe da Casa Civil, Cláudio Puty. “Esses são os dois que nunca gostaram de mim”.
Ela também critica a Assembléia Legislativa, creditando à Casa uma parcela de responsabilidade na sua decisão de deixar a AGE: “Já pensou o que é um estado em que o governo pede dinheiro para fazer obras e o Legislativo quer mandar nisso, um estado onde o Legislativo não deixa o Executivo fazer nada? Vou sair porque também não agüento mais essa coisa de o Legislativo mandar no Executivo.”
Diz, sobre a situação de quem ascende ao governo, no Pará e no Brasil: “Mesmo que o cara seja honesto, chega lá e acaba tendo de fazer concessões e mais concessões, até porque a mídia, com seus interesses, bate direto nele”
E desabafa, mais adiante, ainda sobre a queda de braço com a Assembléia Legislativa: “O PMDB fala dos relatórios da AGE e não cita a Asipag. Mas, para que é que existe a Asipag? É para que os políticos fiquem bem; eles pegam dinheiro da Asipag. Essa história tem tudo a ver com o sistema”.
Aos 57 anos de idade, dez deles como funcionária de carreira da CGU, Tereza também recorda o projeto de abertura das contas públicas que trouxe para o governo, com o Portal da Transparência, que, no entanto, “não funcionou e acabou abortado”.
Jura, no entanto, que o portal foi tirado do ar “por questões tecnológicas”, mas que deverá retornar, totalmente reformulado pela Prodepa, no final deste mês, até por força da Lei Capiberibe, que obriga à democratização dos dados da execução orçamentária de todos os Poderes.
Tereza diz que a AGE “é uma página da minha vida que quero virar”, e explica a relutância em falar, neste momento, aos jornalistas: “Eu me preocupo em despertar uma luta insana. Sem ter a proteção de uma ONG e da sociedade civil vou ficar extremamente desgastada”.
A ONG, porém, está saindo do forno: ainda neste semestre, Tereza pretende lançar o “Observatório da Cidadania”, que vai “zelar pela coisa pública”.
Acha que é preciso agir para mudar a base do sistema político.
Diz que não quer morrer “sem pensar que tentei interferir nesse processo”.
E arremata: “Saio do governo, como na letra daquela música: com a mente aberta, a espinha ereta e o coração tranqüilo”.
A ex-auditora geral do Estado, Tereza Cordovil, está farta de política. Ou melhor, da maneira como se faz política no Pará e no Brasil.
Teria sido esse, aliás, o principal fator a motivar o seu pedido de exoneração do cargo, na semana passada.
“Não briguei com ninguém.
Tenho o maior respeito e admiração pela governadora: ela é uma guerreira, que chegou ao governo cheia de boas intenções. Não estou saindo chateada com ela. Estou saindo porque não gosto da maneira como o sistema político funciona no Brasil”, justifica.
É provável que a explicação não convença nem gregos, nem troianos.
Mas, apesar da tranqüilidade que parece imune à ameaça de mil vendavais, Tereza não consegue esconder o incômodo diante do tratamento dado às auditorias que realizou no governo, num desgastante e imprescindível trabalho de controle interno.
Na tarde de ontem, conversei, por telefone, com Tereza Cordovil.
Por questões éticas, ela não fala abertamente das pressões, internas e externas, destes três anos em que esteve à frente da Auditoria Geral do Estado (AGE).
Mas, aqui e ali, deixa entrever o tremendo abacaxi que, estoicamente, teve de descascar.
“Fui testemunha da luta dessa mulher (a governadora Ana Júlia Carepa) para fazer valer o controle interno no governo. E hoje me dói vê-la pagar o preço de ter me mantido no governo”, observa.
E completa, acerca das auditorias que realizou, cujas cópias foram encaminhadas, na última quinta-feira, à Assembléia Legislativa: “O que era para ser uma coisa normal, se transformou numa coisa do outro mundo. Os controles são mal vistos. É uma questão de contaminação do sistema”.
O incômodo de Tereza vem do anúncio, por setores da imprensa, acerca do “conteúdo bombástico” dessas auditorias – ferramentas, aliás, normalíssimas do controle interno, que serve justamente para evitar ou frear a ocorrência de erros formais, ou até de fraudes, dentro da máquina pública.
E aqui cabe um parêntese, para uma explicação desta repórter que vos escreve.
Tereza não diz, mas pessoas próximas a ela admitem que todo esse imbróglio foi causado por um erro do próprio governo petista, que teria sido o primeiro a “partidarizar” esse ganho tão importante da administração pública, que é o controle interno.
Tudo teria começado quando o governo vazou para a imprensa o resultado de uma auditoria no hospital Ofir Loyola, para justificar o troca-troca na instituição, então sob o comando do PMDB.
Furioso com o vazamento da papelada e com a “intervenção branca” em seu quintal, o PMDB partiu para o contra-ataque: através da deputada Simone Morgado, requisitou os relatórios de todas as auditorias realizadas pela AGE.
E como a AGE titubeasse em atender à requisição, Tereza viu-se até ameaçada de um processo.
De sorte que a guerra interna governista virou uma bola de neve, em pleno ano eleitoral.
Ou, melhor: uma fogueira em que poderão arder, indistintamente, todos os partidos.
“A governadora me colocou na AGE e me manteve lá. E eu vejo o nosso trabalho usado para fins políticos”, queixa-se a ex-auditora.
Pior: Tereza acredita que acabou sendo deixada sozinha nessa queda de braço, que ameaçava até manchar-lhe a ficha funcional.
“Se fosse na CGU (Controladoria Geral da União) a AGU (Advocacia Geral da União) teria entrado com uma medida judicial impedindo isso”, diz Tereza, acerca da entrega da documentação à Assembléia Legislativa.
Segundo ela, há uma tese constitucional de que o controle interno só deveria entregar os documentos em seu poder “com motivação”.
“Foi isso que sugeri (ao governo). Mas fiquei sozinha nessa luta. Era para a PGE (Procuradoria Geral do Estado) ter entrado com um pedido de liminar, dizendo que o controle interno é um órgão independente”, relata.
Agora, observa, “O governo está em polvorosa, porque essa coisa toda está com o PMDB, e eu fico me sentindo mal, como se fosse uma arma nas mãos desses partidos. E tenho medo que isso tome uma grandeza que fuja da nossa governabilidade”.
Mesmo assim, ela jura que nos relatórios entregues à Assembléia Legislativa não há irregularidades graves “à exceção de um ou outro órgão”.
Garante que, na maioria, se resumem a problemas de gestão: “É o cara que não fez um inventário ou que tá cedido (para outro órgão) e sumido”.
E resume: “No Detran é que tem coisas graves. No Detran, Sespa, Seduc e Asipag são os mais graves. O resto são casos de gestão. Na minha opinião, não tem ‘bomba’. Mas, não sei o que os outros vão achar”.
Diz, também, que nos relatórios das auditorias o que se vê “é um órgão de governo lutando pela melhoria de gestão”.
Conta que levou os problemas detectados nesses órgãos ao conhecimento da governadora Ana Júlia Carepa “e ela me dizia para resolver, sempre me deu poderes para isso”.
E que muitas vezes foram os secretários e diretores de órgãos a solicitar o pente-fino da AGE: “Eu conversava com os gestores, a Sandra Leite (Iasep), Regina Lima (Funtelpa), Suely Oliveira (ex-Sedurb). Eles me ligavam preocupados e eu ia lá. Os cartéis estão aí, doidos para entrar no governo. E eles (os secretários) ligavam pra gente. E quantas vezes a gente impediu que os problemas acontecessem”.
E arremata: “O Governo não é uma podridão”.
Tereza admite que há, no entanto, “secretários complicados”, mas assinala que vários foram trocados durante o governo.
Reticente, salienta que não cabe ao controle interno o julgamento dos problemas detectados: “O controle interno não está lá para buscar bandidos, para ver se tem ou não bandido, mas, para ver se os projetos estão sendo bem feitos. Valorar não cabe ao controle interno, mas, ao TCE (tribunal de contas), Ministério Público e à própria governadora.”
Lembra que, há três anos, só fez a entrega pública de auditorias realizadas pela AGE nos governos tucanos porque “quando cheguei os gestores já não estavam lá e a gente tinha de se resguardar”.
Insiste que vários dos problemas detectados na atual administração foram, sim, levados ao conhecimento da governadora “e em vários casos ela tomou a decisão de demitir”.
Mas, admite, “existia uma banda do governo que era contra a gente.”
Uma “banda” que, afinal, teria ganhado mais espaço, o que também teria contribuído para o seu pedido de exoneração.
Tereza garante, no entanto, que o chamado “núcleo duro” só teve participação “em termos” na sua saída do governo.
Até porque um dos supostos integrantes desse núcleo, o secretário de Ciência e Tecnologia, Maurílio Monteiro, sempre defendeu o trabalho da AGE: “O Maurílio nunca foi contra mim. Ele me apoiou muito. É uma pessoa muito boa, um intelectual”.
No lado oposto estariam, porém, o consultor geral do Estado, Carlos Botelho, “que sempre deu péssimos conselhos à Ana”, e o ex-chefe da Casa Civil, Cláudio Puty. “Esses são os dois que nunca gostaram de mim”.
Ela também critica a Assembléia Legislativa, creditando à Casa uma parcela de responsabilidade na sua decisão de deixar a AGE: “Já pensou o que é um estado em que o governo pede dinheiro para fazer obras e o Legislativo quer mandar nisso, um estado onde o Legislativo não deixa o Executivo fazer nada? Vou sair porque também não agüento mais essa coisa de o Legislativo mandar no Executivo.”
Diz, sobre a situação de quem ascende ao governo, no Pará e no Brasil: “Mesmo que o cara seja honesto, chega lá e acaba tendo de fazer concessões e mais concessões, até porque a mídia, com seus interesses, bate direto nele”
E desabafa, mais adiante, ainda sobre a queda de braço com a Assembléia Legislativa: “O PMDB fala dos relatórios da AGE e não cita a Asipag. Mas, para que é que existe a Asipag? É para que os políticos fiquem bem; eles pegam dinheiro da Asipag. Essa história tem tudo a ver com o sistema”.
Aos 57 anos de idade, dez deles como funcionária de carreira da CGU, Tereza também recorda o projeto de abertura das contas públicas que trouxe para o governo, com o Portal da Transparência, que, no entanto, “não funcionou e acabou abortado”.
Jura, no entanto, que o portal foi tirado do ar “por questões tecnológicas”, mas que deverá retornar, totalmente reformulado pela Prodepa, no final deste mês, até por força da Lei Capiberibe, que obriga à democratização dos dados da execução orçamentária de todos os Poderes.
Tereza diz que a AGE “é uma página da minha vida que quero virar”, e explica a relutância em falar, neste momento, aos jornalistas: “Eu me preocupo em despertar uma luta insana. Sem ter a proteção de uma ONG e da sociedade civil vou ficar extremamente desgastada”.
A ONG, porém, está saindo do forno: ainda neste semestre, Tereza pretende lançar o “Observatório da Cidadania”, que vai “zelar pela coisa pública”.
Acha que é preciso agir para mudar a base do sistema político.
Diz que não quer morrer “sem pensar que tentei interferir nesse processo”.
E arremata: “Saio do governo, como na letra daquela música: com a mente aberta, a espinha ereta e o coração tranqüilo”.
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