Edição de domingo, 29/11/09
BRASÍLIA
THIAGO VILARINS
Da Sucursal
Indícios de desvio de dinheiro público de um dos principais programas do governo federal que visa reduzir o déficit habitacional nas regiões rurais do Estado do Pará passarão a ser investigados pelo Tribunal de Contas da União (TCU). O presidente do TCU, ministro Ubiratan Aguiar, recebeu a denúncia de que recursos financeiros do programa crédito instalação, que concede às famílias assentadas meios de adquirirem materiais para a construção de suas habitações, estão sendo desviados antes de chegar aos colonos e ribeirinhos.
Segundo a denúncia, o dinheiro, que sai do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), está sendo desviado no meio do caminho, depois que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) o repassa as associações ou representantes dos assentados. Trata-se de um programa que, só neste ano, teve investimento superior a R$ 300 milhões no Pará, segundo estimativas do Incra. Para o ano que vem, a previsão é que o montante ultrapasse a marca de meio bilhão de reais.
O valor do crédito vai passar a ser de R$ 15 mil por família, mais que o dobro do que foi pago até este ano: R$ 7 mil. A denúncia foi protocolada pelo deputado federal Zenaldo Coutinho (PSDB-PA), que ainda entregou nas mãos do ministro Ubiratan Aguiar um dossiê feito pela Assembléia Legislativa do Pará (Alepa), de iniciativa do seu companheiro de partido, o deputado estadual Ítalo Mácola.
investigação
'É um dossiê feito pela população ribeirinha que me mandava os documentos. Têm notas e recibos rasurados entre outras coisas. Nós juntamos essa documentação com o CD da sessão especial que houve na Alepa, com denúncias de viva voz feitas pelos ribeirinhos, inclusive, por prefeitos da região do baixo Tocantins. Está tudo nesse dossiê, constatando o que estamos dizendo', disse Ítalo Mácola.
Pela denúncia, líderes de associações levaram assentados a assinarem um contrato com o discurso de que assim eles seriam beneficiados por um programa do Incra, que lhes concederia R$ 2,4 mil de fomento e uma casa no valor de R$ 7 mil. No entanto, mesmo com contrato assinado e com o dinheiro já alocado para a construção, milhares de pessoas ficaram sem as suas casas.
Mais do que receber o dinheiro e não entregar as casas, a denúncia descreve ainda o drama de famílias que receberam as suas moradias, porém, totalmente construídas fora do tamanho estabelecido pelo Incra e com materiais de péssima qualidade. O relatório revela que casas erguidas a menos de um ano e meio estão caindo, trazendo riscos as famílias residentes.
Outros relatos apontam construções de apenas dois cômodos, algumas até sem banheiro. Pelo dossiê, o custo dessas moradias é muito inferior ao valor pago através do crédito. Dos R$ 7 mil a serem investidos em cada construção, nem R$ 3 mil estariam sendo gastos pelas empreiteiras. A suspeita de que as empresas estão se apropriando dessa diferença também estão destacados na denúncia. Em todo o Estado, são somente quatro empreiteiras que prestam esse serviço às associações representantes dos assentados.
Denúncia diz que associações ludibriam assentados de reforma agrária
A escolha da empreiteira é sem licitação, ou seja sem disputa de menor preço e qualidade. Cabe a cada associação definir um regulamento próprio de escolha. O mesmo acontece com as lojas conveniadas para a aquisição dos equipamentos do crédito de fomento. O documento apresentado ao Tribunal de Contas da União (TCU) levanta a suspeita de que os locais indicados pela associação estejam também superfaturando os preços.
'A nossa pressão vai na direção de que se construam as casas já contratadas. Ou seja, que os colonos recebam as casas que assinaram junto às associações, mas que até hoje nem foram construídas, mesmo já tendo encerrado os projetos. O segundo é que o Tribunal de Contas da União, o Ministério Público Federal, e até a Polícia Federal, já que envolve questões de crime, segundo as denúncias, estejam fortemente presente, a nível de inquérito de apuração, para restituição dos valores desviados para esses assentados', afirmou o deputado federal Zenaldo Coutinho (PSDB-PA), que, além levar a denúncia ao TCU, já a havia feito ao MPF, em audiência pública na Câmara Federal, com procurador da República Felício Pontes.
O LIBERAL conversou com o superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em Belém, Elielson Silva, que confirmou a fragilidade do programa. 'Toda política pública é suscetível a falhas, se você conhece alguma que não seja me aponte', defendeu-se. O superintendente confirmou indícios de esquema desvio e determinou auditoria em dois municípios. Em Igarapé-Miri, cerca de R$ 8 milhões foram destinados para a construção de 1.434 casas, no entanto somente 1.060 foram erguidas. Dessas levantadas, nenhuma se adequava ao padrão contratual, tanto nas dimensões, quanto no material. Em relação à apuração no município de Abaetetuba, nenhuma informação foi passada.
PROBLEMAS
'Não é verdadeira a informação de que as casas estavam caindo nas cabeças dos moradores, isso é exagero. Mas detectamos problemas na qualidade de um conjunto de habitações construídos com qualidade duvidosa e casos em assentamentos de habitações não construídas, o que atestava a questão da inexecução do contrato que foi feito. Inclusive, quero deixar claro, que quem faz o contrato é a parte jurídica da associação que representa as famílias e as pessoas que são contratadas. Ao Incra cabe somente alocar o recurso e fiscalizar a aplicação correta desse recurso. E é o que estamos fazendo'.
Segundo ele, constatadas as irregularidades cinco providências foram tomadas. A primeira foi a notificação de fornecedores de materiais e de equipamentos. No prazo de 30 dias, que se encerra amanhã, eles terão que reconstruir as casas que não seguem os padrões da norma. Em 60 dias, ordenou a construção das casas que não foram entregues. Em terceiro, determinou a comunicação dos fatos ao MPF e da adoção dessas providências. Também abriu processo administrativo para apurar a responsabilidade de servidores do Incra, eventualmente, envolvidos em irregularidades. E, por último, a suspensão temporária de aplicação de novos créditos no município de Igarapé-Miri, até que as irregularidades sejam sanadas. (T. V.)
Nota do Blog:
O Deputado Italo Mácola já promoveu uma Sessão Especial na Assembléia Legislativa quando foram apresentadas as denúncias ao Incra, e este as confirmou. Depois, foi recebido pelo Superintendente da Instituição, Elielson Pereira (foto), para saber das providências do Incra, conforme matéria amplamente divulgada por este blog, outros blogs e imprensa paraense.
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